Segue um texto sobre a Guerra de Canudos e outro sobre o Contestado, além de algumas fotos.
ANTONIO CONSELHEIRO
Antônio Vicente Mendes Maciel, o Antônio Conselheiro, foi
um líder do movimento messiânico que reuniu milhares de sertanejos no arraial
de Canudos, no Nordeste da Bahia, à margem do rio Vasa- Barris, onde resistiu
às tropas do Governo Federal.
Nasceu em 13 de março de 1830, na Vila do Campo Maior de
Quixeramobim na então Província do Ceará. Seu pai, Vicente Mendes Maciel era
comerciante de secos e molhados e gostava de se aventurar no ramo da construção
civil. Sua mãe, Maria Joaquina do Nascimento, morreu quando Antônio tinha seis
anos de idade.
Antônio teve uma infância marcada pelos maus-tratos da
madrasta, pelos delírios alcoólicos do pai, pelo extermínio de parentes na luta
de sua família (Maciel) contra os Araújo e pela influência mística, comum no
meio sertanejo.
Abalado com os prejuízos sofridos na área da construção
civil, o pai de Antônio foi ficando cada vez mais desequilibrado e se entregou
ao álcool. Antônio procurava consolá-lo através da leitura da Bíblia. Vicente
morreu em 1855, deixando viúva, três filhas solteiras e Antônio, que se tornou
chefe da família, já que sua madrasta também começava a apresentar sinais de
loucura.
Pressionado pelos antigos credores do pai, e sem grandes
aptidões para os negócios do armazém de secos e molhados, Antônio, temendo o
fracasso, procurava consolo na leitura da Bíblia. Depois que suas irmãs
casaram-se, Antônio começou a pensar em constituir sua própria família.
Foi quando conheceu, vinda de Sobral, acompanhada pela
mãe, a bela e jovem Brasiliana Laurentina de Lima, sua prima de quinze anos de
idade, por quem se apaixonou e casou logo depois da morte de sua madrasta, que
não concordava com essa união.
Em plena crise financeira, nasce o primeiro filho de
Antônio. Ele resolve, então, liquidar o negócio do armazém, penhorando seus
bens e iniciando em companhia da esposa, filho e sogra, suas andanças pelo
interior da Província.
Foi caixeiro em Sobral, escrivão em Campo Grande, onde
nasceu seu segundo filho, foi solicitador (aquele que exercia a função de
advogado sem ser diplomado) em Ipu, foi professor no Crato. Abandonado pela
mulher, entregou-se definitivamente à vida errante de pregador fanático,
percorrendo os sertões do Ceará, Pernambuco, Sergipe e Bahia, onde já era
conhecido como milagreiro.
Quando em 1874, apareceu na Bahia, já o seguiam os
primeiros fiéis. Na Vila de Itapicuru-de-Cima foi preso por suspeita de
homicídio e mandado de volta ao Ceará. Por falta de fundamento da acusação foi
posto em liberdade e voltou à Bahia.
Aderiu à campanha de reformas e renovação espiritual da
Igreja. Passou de 1877 a
1887 andando pelos sertões, parando aqui e acolá, empenhando-se com seus beatos
em construir e restaurar capelas, igrejas e cemitérios. O povo seguia todos os
atos de Antônio Conselheiro, obedecia-lhe cegamente.
Na época, porém, o bispo da Bahia dirigiu circular a
todos os párocos, determinando-lhes que proibissem os fiéis de assistir às
prédicas de Antônio Conselheiro. E, em 1886, o delegado de Itapicuru enviou ao
chefe de polícia da Bahia um ofício, onde se refere à divergência entre o grupo
de Antônio Conselheiro e o vigário de Inhambupe, mas nem a providência do
arcebispo, nem a do delegado deram resultado.
Em 1887, o arcebispo, junto ao presidente da província,
volta a acusar o Conselheiro de pregar doutrinas subversivas. Em resposta, o
presidente tentou internar o Conselheiro num hospício de alienados no Rio de
Janeiro, mas não conseguiu por falta de vaga.
Surge então a primeira “cidade santa”, o arraial do Bom
Jesus, hoje Crisópolis, onde ainda existe a capela construída por Antônio
Conselheiro. Em 1893, quando o governo central autoriza os municípios a
efetuarem a cobrança de impostos no interior, Antônio Conselheiro resolve
pregar contra essa decisão e manda arrancar e queimar os editais.
Depois disso, seu grupo com aproximadamente duzentos
fiéis seguidores parte em retirada, mas é perseguido por uma força de polícia,
formada por trinta soldados que os alcança em Massete. O grupo do
Conselheiro consegue, contudo, derrotar os policiais.
A fuga continua e novos adeptos se juntam aos fugitivos.
Finalmente, se fixam numa fazenda de gado abandonada, à margem do rio
Vasa-Barris, onde fundou uma comunidade, cujos princípios eram propriedade
comum das terras e divisão dos bens adquiridos, denominaram. Antônio
Conselheiro se transformou numa lenda que se espalhou por todo o país. A
população do povoado chegou a milhares de habitantes que recuperaram a região,
criando rebanhos e plantando para o próprio consumo.
Entretanto, o governo continuou a perseguição, mandou
tropas para controlar os rebeldes. Apesar dos canhões e metralhadoras, foram
necessárias quatro expedições para massacrar o povoado. O primeiro ataque
militar aconteceu em outubro de 1896, por iniciativa do governo da Bahia. A
segunda expedição foi em janeiro de 1897, comandada pelo Major Febrônio de
Brito. Em seguida, foi a expedição comandada pelo Coronel Antônio Moreira. A
quarta e maior expedição foi comandada pelo General Arthur de Andrade
Guimarães.
Novembro de 1896: Começa a guerra de Canudos. Antônio Conselheiro
precisava de madeira para a Igreja Nova em construção e a encomendou em
Juazeiro (BA). O pagamento foi antecipado, mas, no prazo estabelecido, a
madeira não foi entregue. Espalhou-se o boato de que a cidade seria invadida
pelos conselheiristas. A 06 de novembro parte de Salvador (BA), pela Estrada de
Ferro da Bahia ao São Francisco com destino a Juazeiro, a 1ª Expedição Militar
contra Canudos. Era composta de 113 soldados do 9º Batalhão de Infantaria, três
oficiais, um médico e dois guias. 21 de novembro - No amanhecer deste dia a
Expedição encontrava-se ainda em Uauá (BA), quando chegam centenas de
conselheiristas entoando cânticos. Foram recebidos a bala pelos sentinelas
semi-adormecidos e surpresos. Era a guerra. Passadas várias horas de combate,
os canudenses, comandados por João Abade, resolveram se retirar, deixando para
trás um quadro desolador. Apesar da aparente vitória, a expedição estava
derrotada, pois não tinha mais forças nem coragem para atacar Canudos.
29 de dezembro de 1986: Reúne-se em Monte Santo (BA) o efetivo da II Expedição
Militar contra Canudos, composta de forças federais e da polícia militar
baiana. Muito mais poderosa que a anterior, era composta de 609 soldados, 10
oficiais, 1 médico, 1 farmacêutico, 1 enfermeiro, 2 canhões Krupp e 3
metralhadoras Nordefelt. Em 18 de janeiro de 1897 a Expedição atravessava
a Serra do Cambaio quando foi surpreendida por forte emboscada. A luta durou
mais de cinco horas, quando finalmente a força militar prevaleceu e
avançou. Na manhã seguinte houve um novo ataque que ao seu final, deixou
inúmeros corpos restavam estendidos no chão, a maioria de conselheiristas. A
expedição não teve mais condições de prosseguir no seu objetivo que era atacar Canudos.
Estava arrasada e foi obrigada a um recuo lento e penoso.
07 de fevereiro de 1897: Parte de Salvador com destino a Queimadas, a III
Expedição Militar contra Canudos, a mais famosa de todas. Depois de dois
grandes fracassos militares das expedições anteriores, ela tinha a
responsabilidade de "lavar a honra" do Exército, seguindo equipada
com seis canhões Krupp e mais de 1.300 soldados conduzindo 15 milhões de
cartuchos. No comando estava o temível Cel. Moreira César, apelidado de
"corta-cabeças" devido a sua atuação na repressão ao movimento
federalista no sul do país (1893-95). A 03 de março a III Expedição Militar
avista Canudos. Trava-se o combate entre os soldados e os sertanejos; no final
da tarde, as baixas militares eram grandes e o inesperado acontece: o Cel.
Moreira César é atingido por dois tiros e fica fora de combate. Não havia mais
chances para a força expedicionária. Às 19h é anunciado o toque de retirada.
05 de abril de 1897: É criada a IV Expedição Militar contra Canudos, dividida
em duas colunas. A 1ª Coluna, sob o comando do Gal. Silva Barbosa sai de
Queimadas e passa por Monte Santo, composta de 3.415 homens, 180 mulheres, 12
canhões Krupp e 1 canhão Withworth 32. Na retaguarda, protegendo 750 mil quilos
de mantimentos e munições, seguia o 5° Corpo de Polícia da Bahia, destacamento
formado por 388 jagunços contratados no interior do Estado. A 2ª Coluna sob o
comando do Gal. Cláudio Savaget, parte de Sergipe em tropas isoladas, se
agrupando em Jeremoabo (BA), de onde segue para Canudos, composta de 2.340
homens, 512 mulheres e 74 crianças, inclusive duas nascidas durante a marcha.
Travam-se horríveis combates e a IV expedição é obrigada a pedir mais reforços.
Em 22 de setembro, morre Antonio Conselheiro.
05 de outubro de 1897: Após quase um ano de conflito termina a resistência
sertaneja, Canudos estava destruída. Num cenário de fim de mundo, por entre
becos e ruelas, uma legião de corpos carbonizados se misturam com as ruínas e
as cinzas das 5.200 casas. Estima-se que mais de 25 mil conselheiristas morreram
no conflito que mobilizou um contingente superior a 12 mil soldados do Exército
(mais da metade de todo o efetivo nacional), na maior guerra de guerrilhas que
o Brasil já viveu.
A região denominada "Contestado"
abrangia cerca de 40.000 Km2 entre os atuais estados de Santa Catarina e
Paraná, disputada por ambos, uma vez que até o início deste século a fronteira
não havia sido demarcada. As cidades desta região foram palco de um dos mais importantes
movimentos sociais do país.
A região do interior de Santa
Catarina e Paraná desenvolveu-se muito lentamente a partir do século XVIII,
como rota de tropeiros que partiam do Rio Grande do Sul em direção à São Paulo.
No século XIX algumas poucas cidades haviam se desenvolvido, principalmente por
grupos provenientes do Rio Grande, após a Guerra dos Farrapos, dando origem a
uma sociedade baseada no latifúndio, no apadrinhamento e na violência. Após a
Proclamação da República, com a maior autonomia dos estados, desenvolveu-se o
coronelismo, cada cidade possuía seu chefe local, grande proprietário, que
utilizava-se de jagunços e agregados para manter e ampliar seus "currais
eleitorais", influenciando a vida política estadual. Havia ainda as disputas
entre os coronéis, envolvendo as disputas por terras ou pelo controle político
no estado.
Em 1908 a empresa norte
americana Brazil Railway Company recebeu do governo federal uma faixa de terra
de 30Km de largura, cortando os 4 estados do sul do país, para a construção de
uma ferrovia que ligaria o Rio Grande do Sul a São Paulo e ao mesmo tempo, a
outra empresa coligada passaria a explorar e comercializar a madeira da região,
com o direito de revender as terras desapropriadas ao longo da ferrovia.
Enquanto os latifundiários e as
empresas norte americanas passaram a controlar a economia local, formou-se uma
camada composta por trabalhadores braçais, caracterizada pela extrema pobreza,
agravada ainda mais com o final da construção da ferrovia em 1910, elevando o
nível de desemprego e de marginalidade social. Essa camada prendia-se cada vez
mais ao mandonismo dos coronéis e da rígida estrutura fundiária, que não
alimentava nenhuma perspectiva de alteração da situação vigente. Esses elementos,
somados a ignorância, determinaram o desenvolvimento de grande religiosidade,
misticismo e messianismo.
Os movimentos messiânicos são
aqueles que se apegam a um líder religioso ou espiritual, um messias, que passa
a ser considerado "aquele que guia em direção à salvação". Os
"líderes messiânicos" conquistam prestígio dando conselhos, ajudando
necessitados e curando doentes, sem nenhuma pretensão material,
identificando-se do ponto de vista sócio econômico com as camadas populares. Na
região sul, a ação dos "monges" caracterizou o messianismo, sendo que
o mais importante foi o monge João Maria, que teve importante presença no final
do século passado, época da Revolução Federalista (1893-95).
Durante muitos anos apareceram e
desapareceram diversos "monges", confundidos com o próprio João
Maria. Em 1912 surgiu na cidade de Campos Novos, no interior de Santa Catarina,
o monge José Maria. Aconselhando e curando doentes a fama do monge cresceu a
ponto de receber a proteção de um dos mais importantes coronéis da região,
Francisco de Almeida. Vivendo em terras do coronel, o monge recebia a visita de
dezenas de pessoas diariamente, provenientes de diversas cidades do interior.
Proteger o monge passou a ser sinal de prestígio político, por isso, a
transferência de José Maria para a cidade de Taquaruçu, em terras do coronel
Henrique de Almeida, agudizou as disputas políticas na região, levando seu
adversário, o coronel Francisco de Albuquerque, a alertar as autoridades
estaduais sobre o desenvolvimento de uma "comunidade de fanáticos" na
região.
Durante sua estada em Taquaruçu,
José Maria organizou uma comunidade denominada "Quadro Santo",
liderada por um grupo chamado "Os Doze pares de França", numa alusão
à cavalaria de Carlos Magno na Idade Média, e posteriormente fundou a
"Monarquia Celestial".
Ao iniciar a Segunda década do
século, o país era governado pelo Marechal Hermes da Fonseca, responsável pela
"Política das Salvações", caracterizada pelas intervenções político-militares
em diversos estados do país, pretendendo eliminar seus adversários políticos.
Além da postura autoritária e repressiva do Estado, encontramos outros
elementos contrários ao messianismo, como os interesses locais dos coronéis e a
postura da Igreja Católica no sentido de combater os líderes
"fanáticos".
O primeiro conflito armado ocorreu na região de Irani, ao sul de Palmas, quando
foi morto José Maria, apesar de as tropas estaduais terem sido derrotadas pelos
caboclos. Os seguidores do monge, incluindo alguns fazendeiros reorganizaram o
"Quadro Santo" e a Monarquia Celestial; acreditavam que o líder
ressuscitaria e o misticismo expandiu-se com grande rapidez. Os caboclos
condenavam a república, associando-a ao poder dos coronéis e ao poder da Brazil
Railway.
No final de 1913 um novo ataque foi
realizado, contando com tropas federais e estaduais que, derrotadas, deixaram
para trás armas e munição. Em fevereiro do ano seguinte, mais de 700 soldados
atacaram o arraial de Taquaruçu, matando dezenas de pessoas. De março a maio
outras expedições foram realizadas, porém sem sucesso. A organização das
Irmandades continuou a se desenvolver e os sertanejos passaram a Ter uma
atitude mais ofensiva. Sua principal líder era uma jovem de 15 anos, Maria Rosa,
que dizia receber ordens de José Maria. Em 1° de setembro foi lançado o
Manifesto Monarquista e a partir de então iniciou-se a "Guerra
Santa", caracterizada por saques e invasões de propriedades e por um
discurso que vinculava pobreza e exploração à República. A partir de dezembro
de 1914 iniciou-se o ataque final, comandado pelo General Setembrino de
Carvalho, mandado do Rio de Janeiro a frente das tropas federais, ampliada por
soldados do Paraná e de Santa Catarina. O cerco à região de Santa Maria determinou
grande mortalidade causada pela fome e pela epidemia de tifo, forçando parte
dos sertanejos a renderem-se, sendo que os redutos "monarquistas"
foram sucessivamente arrasados.
O último líder do Contestado,
Deodato Manuel Ramos, foi preso e condenado a 30 anos de prisão, tendo morrido
em uma tentativa de fuga.
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Vista geral do arraial de Canudos |
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Sertanejos feitos prisioneiros |
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Canudos |
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Igreja do Arraial de Canudos |
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Vista geral do Arraial de Canudos |